sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Mais poesia

Diz a escritora Adélia Prado:
"A poesia, a mais íntima, é serva da esperança".
Assim, desejo-lhe para o ano de 2011 um pouco mais de poesia.
Para vida ser mais leve e encantada.
Quem sabe, um pouco menos de trabalho e de correria, em troca de doses de poesia.
Para gerar, nutrir e disseminar esperança.
E com a esperança, fé e amor-solidário.
Afinal, é o que importa.
Feliz 2011!
Murad

domingo, 26 de dezembro de 2010

Jane, Lorrane e Gilberto

Era o entardecer da véspera de natal. Caminho pelo centro de Belo Horizonte, após a última reunião de trabalho do ano. De repente, encontro Jane na calçada. Negra, rosto envelhecido, ex moradora de rua, trabalha como lavadora de carro, vende doces e balas. Descobri-a, faz muitos anos, quando eu morava na região. Naquele tempo, ela bebia muito, não tinha sequer um cantinho para moradia e andava na rua com a filha mais nova, que recebeu o nome chique de “Lorrane”. Graças ao trabalho do Irmão Raimundo, que a acolheu carinhosamente e resgatou sua dignidade com a ajuda de outras pessoas, Jane hoje tem um barraco na periferia e a filha freqüenta a escola. Com orgulho, apresentou-me novamente Lorrane: “Ela Já tem 10 anos. Veja como está grande e bonita”. E Jane completou: “Tenho ainda outra filha, de 15 anos, que mora na Itália. Dizem que ela fala três línguas e está bem por lá. Mas eu quero encontrar minha filha!”.
Saí deste inesperado encontro lembrando-me dos pastores que foram visitar Jesus em Belém. Gente pobre, simples, de má fama, são os primeiros a provar da alegria do “Deus conosco”. Imaginei Jane e Lorrane no presépio, na gruta de Belém, olhando para Jesus.

Hoje é natal. Vim para Vila Velha (ES) e após a missa, o padre nos convidou: “Lá fora, na área livre embaixo da ponte, a comunidade está organizando um jantar para o povo de rua e moradores dos abrigos públicos”. Fui lá ver. Tudo bem organizado, comida boa, presentes, grupo acolhedor! Chegaram umas 20 pessoas. Sentei-me à mesa com duas delas. A primeira, Dona Maria, uma senhora que deveria ter uns 75 anos. Vinda do Sul da Bahia, sem recursos, mora num abrigo da prefeitura. Estava transbordando de alegria: alimento saboroso, presentes, música ao vivo. Ah, era demais tanta coisa boa ao mesmo tempo!
Meu segundo companheiro de mesa era um adulto de aproximadamente 35 anos. Gilberto, nascido em Guarapari, é flanelinha e lavador de carro na praia da costa. Hoje trabalhou o dia inteiro. Veio direto para o evento, pois ficou sabendo que ia ter uma festa de graça, de natal. Contou-me que tem quatro filhos pequenos e vive de seu trabalho. Não teve dinheiro para comprar os presentes para as crianças. Quando recebeu os presentes da comunidade, seu rosto se transfigurou. Lentamente, recolheu tudo o que havia recebido numa sacola plástica. Agora teria algo para oferecer aos filhos! Quando terminou de jantar, delicadamente pediu licença, e todo contente foi para casa, levando ainda uma marmita de comida para a mulher e a criançada.

Novamente me veio ao coração a imagem dos pastores de Belém. Desta vez, eu estava sendo visitado pelos pobres. Eles me recordavam não somente os pastores, também o próprio menino Jesus, pobre envolvido em panos, alojado fora da casa. Provei algo do espírito do natal...

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

A festa do encontro

A vida humana se enriquece de maneira profunda quando há encontros.

Encontros de pessoas, de grupos, de povos, de nações.
Unir-se de fragmentos, soma transmutada em multiplicação.
Possibilidades de fortalecer e ampliar raízes, estabelecer conecções.
Algo mais do que estar geograficamente ou virtualmente próximo.
Gesto de aproximar-se, romper as solidões, questionar a auto-suficiência, trocar, abrir as mãos, olhar o outro e reconhecer sua alteridade.

Encontrar-se é tecer laços que transformam as diferenças em oportunidades de aprender.
Uma energia boa circula, de forma que os interlocutores se saciam, para buscar novos encontros ou tecer laços mais estreitos nos mesmos encontros.
O natal é a grande celebração do encontro.
Encontro de Deus com a humanidade, a ponto de se fazer um nós, para intensamente se tornar um conosco. Por isso, o menino de Belém é chamado “Emanuel”: Deus conosco.
Viva o natal, a festa do encontro!

Desta luz que ilumina tenuamente a gruta escura de Belém, se expande a Luz que se revela caminho a seguir, verdade em construção, vida comunicada.
Ao redor de Jesus acontecem muitos encontros: Maria, José, os pastores, os magos, o povo que se alegra. E essa alegria contagiante abraço o solo, o ar, a água, a energia do sol, os microorganismos, as plantas, os animais, toda a humanidade.
O filho de Deus se fez carne, se fez matéria. Para fazer-se encontro.
Viva o natal!
Afonso Murad

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Educação no Brasil: longo caminho a percorrer

Segundo a Folha de São Paulo*, “os estudantes brasileiros com 15 anos melhoraram em leitura, ciências e matemática nos últimos nove anos. Seguem, porém, entre os mais atrasados do mundo. A constatação é da avaliação internacional chamada Pisa, coordenada pela OCDE (organização de nações desenvolvidas), que analisou a educação em 65 países".
O exame avalia as áreas a cada três anos. Nesta edição, a prioridade foi leitura, em que a média brasileira avançou 4%. Essa melhora significa que o aluno de hoje tem um conhecimento equivalente a seis meses de aula a mais do que os de 2000, conforme cálculo da Folha”.
O avanço foi "impressionante". Ainda assim, os brasileiros estão com mais de três anos de defasagem ante os chineses, os líderes da lista, que passaram Finlândia e Coreia.
Mas, no ranking o Brasil está na 53ª posição, com nota semelhante a Colômbia e Trinidad e Tobago. Os avanços percentuais em ciências e matemática foram maiores que os de leitura, mas as colocações são semelhantes.
A avaliação aponta que o conhecimento médio do aluno brasileiro permite que ele entenda o núcleo simples em um texto, mas não consegue encontrar, a partir de trechos diferentes, a ideia principal de uma obra.

A notícia faz pensar. De um lado, houve melhoria na educação, fruto de imensa dedicação de professores, professoras, e gestores(as) que no cotidiano das escolas públicas e particulares, tem se dedicado com afinco à sua missão. Embora menos do que seria preciso, convém ressaltar ainda o compromisso do poder público de vários municípios, estados e da Governo Federal. De outro lado, estamos com uma situação ainda muito aquém do aceitável para uma nação com tanto potencial. A superação da pobreza e da exclusão social exige mais atenção à educação e aos educadores, nos diversos níveis. Nesta tarefa, todos nós que atuamos em escolas ou universidades nos chamamos interpelados! E temos que fazer ouvir nossas conquistas e nosso clamor.

*FSP,8 dezembro 2010