quinta-feira, 28 de março de 2013

Prece pascal


Obrigado, Jesus, pela sua missão libertadora e salvadora: anúncio, cura do corpo e da alma, inclusão social e religiosa, proximidade de Deus Pai-mãe, acolhida aos pobres e pecadores, carinho sem igual para as crianças, esperança para os desesperados.
Eu te dou graças pelo seu gesto radical de amor-entrega na ceia: corpo doado, sangue derramado, partilha em torno à mesa, memória sempre presente.
Contigo percorro os caminhos da via crucis: julgamento injusto, enfrentamento com Herodes e Pilatos, quedas, encontros, alertas, dores, morte que clama aos céus, abandono, amor consumado.
Sem ti passo o sábado do silêncio e da espera.
Com meus irmãos e irmãs te louvo, pois venceste a morte, estás VIVO, conosco, com toda a humanidade, traçando caminhos luminosos.
Aleluia! O Senhor ressuscitou!

segunda-feira, 25 de março de 2013

Memória viva de Oscar Romero

Partilho com você 10 frases de Oscar Romero, selecionados por Frei Gilvander Moreira. O bispo de El Salvador foi assassinado há 33 anos atrás, no dia 24 de março, e sua voz ecoa como grito pela justiça e pela paz.

(1) “Irmãos, eu gostaria de gravar no coração de cada um esta ideia: o cristianismo não é um conjunto de verdades nas quais devemos acreditar, de leis que devem ser cumpridas, de proibições! Assim se torna muito repugnante. O cristianismo é uma pessoa, que me nos amou tanto, que pede nosso amor. O cristianismo é Jesus Cristo e o evangelho.” (06/11/ 1977).

(2) “Que maravilha será o dia que cada batizado compreender que sua profissão, seu trabalho, é um trabalho sacerdotal; que, assim como eu celebro a missa no altar, cada carpinteiro celebra sua missa na sua carpintaria, cada profissional, cada médico com seu bisturi, a mulher na feira, no seu lugar de trabalho… estão fazendo um ofício sacerdotal. Quantos motoristas que escutam esta mensagem no seu táxi. Tu, querido motorista, junto ao volante do seu táxi és um sacerdote se trabalhas com honradez, consagrando a Deus seu táxi, levando uma mensagem de paz e de amor a teus clientes que vão no seu automóvel.” (20/11/1977)
 
(3) “Uma religião de missa dominical, mas de semanas injustas não agrada ao Deus da Vida. Uma religião de muita reza, mas de hipocrisias no coração não é cristã. Uma Igreja que instala só para estar bem, para ter muito dinheiro, muita comodidade, porém que não ouve os clamores das injustiças não é a verdadeira igreja de nosso Divino Redentor.”(04/12/1977)
 
(4) “Ainda quando nos chamem de loucos, ainda quando nos chamem de subversivos, comunistas e todos os adjetivos que se dirigem a nós, sabemos que não fazemos nada mais do que anunciar o testemunho subversivo das bem-aventuranças,  que proclamam bem-aventurados os pobres, os sedentos de justiça, os que sofrem.” (11/05/1978)
 
(5) “Muitos querem que o pobre sempre diga que é “vontade de Deus” que assim sobreviva. Não é vontade de Deus que uns tenham tudo e outros não tenham nada. Não pode ser de Deus. A vontade de Deus é que todos os seus filhos e filhas sejam felizes.”(10/09/1978)
 
(6) “É ridículo dizer que a Igreja se tornou marxista. Porém há um "ateísmo" mais próximo e mais perigoso para nossa igreja: o ateísmo do capitalismo, quando os bens materiais se tornam ídolos e substituem Deus.” (15/09/1978)
 
(7) “Uma igreja que não sofre perseguição, mas que desfruta privilégios e o apoio de coisas da terra – Tenham Medo! – não é a verdadeira igreja de Jesus Cristo.” (11/03/1979)
 
(8) “Quantos existem que não dizem ser cristãos, porque não têm fé…! Têm mais fé no seu dinheiro e em suas coisas do que no Deus que criou tudo.” (03/06/1979)
 
(9) “Para que servem belas estradas e aeroportos, belos edifícios e grandes palácios, se foram construídos com o sangue de pobres que jamais vão desfrutá-los?” (15/07/1979)
 
(10) “Não nos cansemos de denunciar a idolatria da riqueza, que faz consistir a grandeza da pessoa humana no ter e esquece que a verdadeira grandeza é ser. A pessoa humana não vale pelo que tem, mas pelo que é e faz.” (04/11/1979)

sexta-feira, 8 de março de 2013

Um Papa e Duas Mulheres

Partilho com você este inusitado artigo da teóloga e amiga Maria Clara Bingemer, escrito por ocasião do Dia Internacional de Mulher.
O Dia Internacional da Mulher, celebrado a 8 de março, sempre suscita uma série de homenagens em forma de textos, reflexões, clipes, imagens etc. A Igreja Católica se soma a esse coro sempre, mas discretamente.  Neste ano, porém, temos um fato novo. O Papa Bento XVI, após anunciar sua renúncia e celebrando a missa da Quarta feira de Cinzas, citou como exemplo da conversão à qual o Povo de Deus é convidado no início da Quaresma  duas mulheres: a jovem judia holandesa Etty Hillesum e a católica estadunidense Dorothy Day.
Duas biografias diferentes, dois perfis bem diversos.  Mas, no fundo, quantos e quão importantes traços em comum.  Um desejo radical e profundo as fez buscar em pessoas, ideologias e experiências várias a fonte onde pudessem saciar sua sede.  Pois enquanto Etty era uma jovem mulher extremamente sensual, com vários namorados, outros tantos admiradores e uma grande cultura e paixão pela literatura, Dorothy também se apaixonou, amou e foi amada, mas antes foi usada e abandonada.  Também amava a literatura e era uma voraz leitora. Ambas, cada uma em seu momento, foram fascinadas pelo socialismo, chegando Dorothy a ser membro do Partido Comunista.

Ambas encontram a Deus por uma mediação humana.  Para Etty, foi Julius Spier,o psicólogo discípulo de Jung, que lhe deu coragem para rezar e dirigir-se a Deus. Para Dorothy, foi a filha Tamar Therese, gerada após um aborto que ela acreditava havê-la tornado estéril para sempre.  Ávidas de verdade, de absoluto, de sentido para suas vidas, ambas não hesitaram em mergulhar de cabeça nos braços desse Deus que lhes revelou Seu rosto amoroso e sedutor. Etty recebeu graças e viveu experiências comparáveis às dos maiores místicos de toda a história da espiritualidade. Dorothy fez um percurso cada vez mais radical na vivência do Evangelho de Jesus Cristo na sua integridade mais plena.
A conversão e a experiência de Deus deram seu fruto em ambas através de compromissos concretos.  Para Etty, o amor de Deus que transformou sua vida passou a ter o rosto de seu povo perseguido, dizimado e exterminado em pleno holocausto nazista.  Sua maturidade espiritual chega juntamente com o desejo e a decisão de partilhar o destino massivo e coletivo do povo judeu triturado pelo nazismo.  Recusa toda a possibilidade de evadir-se e escapar e vai para Auschwitz, onde morre nas câmaras de gás em agosto de 1943, aos 29 anos.
Para Dorothy,  a conversão a Deus passa pela conversão aos pobres.  É em meio a estes e estas que a jornalista liberal e namoradeira vai sentir-se em casa, que descobrirá a verdadeira beleza.  É deles e delas que fará a prioridade número um de sua vida longa, de 80 anos.  O amor pelos pobres, inspirado pelo Evangelho de Jesus, levou Dorothy a identificar-se totalmente com os pobres, que em seu país e em seu tempo eram os migrantes, os desempregados da grande depressão dos anos 1930.  E mais tarde os soldados recrutados à força para participar de guerras injustas como a do Vietnam entre outras. Vestida com a roupa doada aos indigentes, comendo como eles, Dorothy morreu em meio a eles, totalmente irmanada aos que são os preferidos de Deus segundo Jesus Cristo.

Propondo o exemplo dessas duas mulheres aos cristãos do mundo inteiro no umbral da Quaresma, Bento XVI mencionou sua conversão. Etty Hillesum, insatisfeita e sedenta de verdade, por fim descobriu dentro de si o poço profundo no qual estava Deus.  Daí em diante a história de sua vida foi outra e outro seu destino. Dorothy Day, primeiro seduzida pelas ideologias de seu tempo, terminou por escolher a verdade e abrir-se à fé. Trilhou fielmente esse caminho em plena secularidade e em profunda comunhão com os pobres e os últimos deste mundo. Aí e somente aí encontrou a paz e a alegria que tanto buscara.
Neste Dia Internacional da mulher vale relembrar as duas mulheres que o Papa - que recém deixou a Sé de Pedro - valorizou como exemplos do que seja a metanoia que a Quaresma propõe. Para além das pertenças institucionais e eclesiásticas, a judia Etty Hillesum e a católica Dorothy Day nos sinalizam o que é ser mulher: ser aberta, habitada por um desejo profundo, disposta a abraçar maternalmente todas as dores do mundo para redimi-las com seu corpo e sua vida. Duas mulheres livres e inspiradoras, essas que Bento XVI nos deixa como presente ao despedir-se do pontificado.
Maria Clara L. Bingemer