sexta-feira, 22 de abril de 2011

Homens e Deuses

Nesta semana santa, assisti o filme “Homens e Deuses”. Seguindo a recomendação da amiga e teóloga Maria Clara L. Bingemer e seu marido, fui ao cinema com o coração aberto, para ver o que Jesus me diria com este filme. Voltei extasiado e pensativo. A película, baseada em fatos reais, narra o fato de uma comunidade monástica de franceses que vivia como missionária na Argélia, numa pequena comunidade mulçumana. O perigo eminente de perseguição e assassinato, devido à corrupção do governo e a pressão de grupos fundamentalistas islâmicos leva a comunidade de 8 monges e se perguntar sobre o sentido de sua vida e de sua missão. E a reafirmar, com novo vigor, o compromisso assumido.

O filme testemunha algo que experimentamos também aqui na América Latina: o compromisso de vida de cristãos com a causa do Reino de Deus, a ponto de colocar em jogo a possibilidade da continuidade da existência. Na experiência de vida destes monges franceses ecoa o mesmo Espírito que mobilizou Dom Oscar Romero, Irmã Dorothy e tantos outros(as) testemunhas e mártires.

A cena que mais me tocou foi a ceia dos monges. Comem e bebem um pouco de vinho com alegria, contentamento e certa apreensão. Nela se pressentia a última ceia de Jesus, a festa que prepara o desenlace da vida entregue. Nestes homens concretos apresentados no filme, com fisionomias de medo e coragem, imbuídos do desejo de serem fiéis a Jesus, encarnando-se no meio dos pequenos, celebrei nesta semana santa o gesto de entrega de tantos homens e mulheres que vivem intensamente o seguimento de Jesus.

Mais do que um filme belo, “Homens e Deuses” é uma reflexão sobre a radicalidade da vida cristã hoje. Um estímulo para viver o mistério pascal. Recomendo que você veja o filme e comente com seus amigos(as).
Partilho aqui trechos da análise feita por Maria Clara sobre “Homens e Deuses”.

“Premiado em Cannes, o filme já alcançou uma bilheteria de três milhões, fato raríssimo no cinema europeu. Os jovens lotam as salas de exibição, fascinados pela história profunda e comovente daquela comunidade que há quinze anos, discerniu e decidiu ficar em Thibirine correndo risco de vida para não abandonar o povo do lugar, na sua grande maioria muçulmano, com quem havia feito uma aliança de vida e morte.
Cinematograficamente, estamos diante de uma obra de arte. A direção impecável de Xavier Beauvois vai conduzindo o espectador suave e firmemente ao longo da trajetória espiritual daquela comunidade que, em meio a seu cotidiano feito de oração, trabalho manual e vida cenobítica, é chamada a tornar concreta a entrega radical da vida já realizada ao pronunciar os votos religiosos.
A fragilidade de homens que têm medo e querem viver, tentados a ir embora dali e salvar sensatamente suas vidas vai sendo revertida pelo chamado de Deus e do povo argelino. Os frágeis homens então se agigantam, banhados pela luz da inspiração divina e pela paz da adesão à vontade d’Aquele que é o Senhor de suas vidas.

Ao longo de todo o filme, destaca-se a figura do prior – em grande interpretação de Lambert Wilson – que exercendo seu ministério de Abba-pai daquela comunidade, conversa com cada um, escuta, reza, ouve, sofre. (Ele) reforça em cada um de seus irmãos a coragem necessária para o sacrifício e o testemunho definitivos que virão. Na vida real, esse grande homem, Christian de Chergé, escreveu seu testamento espiritual sentindo a morte que se aproximava e deixou um legado de fé e estatura espiritual ao qual hoje o filme de Xavier Beauvois faz justiça. Alavancado pelo filme, seu diário encontra-se esgotado em várias livrarias francesas.
Homens ou deuses? Homens, certamente, mas que permitem que a graça divina os configure segundo a grandeza do próprio Cristo. Que a memória ardente destas testemunhas possa converter-nos. E encher nossa vida com um pouco mais de beleza e grandeza”.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

José Comblin: tributo ao teólogo-profeta

Inicialmente, conheci José Comblin através de seus escritos. Quando eu tinha 17 anos, chegou-me às mãos um pequeno livro, intitulado “O enviado do Pai”. Era uma reflexão sobre o Evangelho de João: profunda, instigante e acessível. Da mesma forma, li também outro livrinho sobre Jesus no Evangelho de Marcos. Fiquei fascinado com ambos. E me perguntava quem era aquele autor.
Quando comecei a participar das CEBs e das pastorais populares, ouvi falar do Padre Comblin. Dizia-se que ele era um grande teólogo (embora de baixa estatura), que havia organizado um processo de formação teológica original para a realidade rural, denominada “teologia da enxada”. No correr dos anos de atuação pastoral e formação teológica, li outras obras de Comblin. Dentre elas, destaco “Tempo do Espírito” e “História da Teologia Católica”. Passei a admirar este homem, que demonstrava ampla cultura geral e grande capacidade de articulação de informação. Seu jeito de escrever tinha também uma crítica apurada e por vezes irônica.

Finalmente, depois de tantos anos, conheci Comblin pessoalmente num Encontro Intereclesial de Comunidades Eclesiais de Base. E me encontrei com ele outras vezes em Assembléias da SOTER (Sociedade de Teologia e Ciências da religião). Durante o Forum de Teologia e Libertação em Porto Alegre, ficamos hospedados no mesmo espaço, e então conversamos sobre muitas coisas. Uma delas, que me recordo bem, era a ênfase sobre a necessidade de formar bem o laicato cristão, como forma de ajudar a superar o centralismo e o clericalismo.
Uno-me a tantos teólogos(as) do Brasil, no momento de sua morte, prestando tributo a este grande pensador. Que seu espírito de profecia se difunda na nova geração de homens e mulheres que pensam sobre a fé cristã. Amém!