terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Curso "Gestão e Espiritualidade"

Nos dias 18 a 20 de janeiro estou trabalhando com um curso intensivo sobre "Gestão e Espiritualidade", no IFTEG (Instituto de Filosofia e Teologia de Goiás), dirigido a um grupo de religiosos e leigos.
Partilho com você a proposta desta disciplina, que faz parte de uma Especialização, promovida por esta instituição de Ensino Superior.

Objetivos
- Conhecer os conceitos básicos e os pilares da gestão, relacionando-os à prática pastoral.
- Identificar os principais empecilhos à gestão no âmbito eclesial.
- Fazer uma reflexão bíblico-teológica sobre “poder e participação”.
- Estabelecer relação entre missão e gestão estratégica, à luz da espiritualidade cristã.
- Abordar o tema da Espiritualidade, com analogias e conceitos básicos.
- Sensibilizar-se para o cultivo cotidiano da espiritualidade.
- Construir em grupo os sinalizadores da espiritualidade na gestão das organizações.
- Fazer uma leitura espiritual sobre o poder e a gestão.
- Refletir sobre desafios significativos para a gestão eclesial e ensaiar soluções.
- Identificar os pontos de tensão e de diálogo criativo entre gestão e espiritualidade.

Temas
Gestão: conceito básico.
Diferencial das organizações.
Pilares da Gestão.
Empecilhos à Gestão.
Funções do Gestor eclesial
Gestão, poder e participação.
Noções básicas de Espiritualidade
Tensão e colaboração: Gestão e Espiritualidade
Cultivo da Espiritualidade na gestão
Critérios de Instituições espiritualizadas
Questões emergentes de gestão eclesial: visibilidade, significatividade, conectividade, massas e minorias, profetismo social e ecológico.
Redes e parcerias
Marketing, gestão e espiritualidade

Bibliografia básica
Afonso Murad, Gestão e Espiritualidade. Paulinas.

Avaliação
Questões sobre o curso, em forma de perguntas.
Enviar para amurad@marista.edu.br até 31 de março.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

A novidade cósmica da encarnação

Neste tempo de natal, partilho com você estas palavras inspiradas de T.Chardin, que descobre as consequências cósmicas da encarnação do Filho de Deus.

No princípio havia o Verbo soberanamente capaz de sujeitar e de modelar toda Matéria que nascia.
No princípio não havia frio e trevas; havia o Fogo, a luz preexistente que, paciente e infalivelmente, elimina nossas sombras.
Espírito ardente, Fogo fundamental e pessoal”.

Aconteceu. O Fogo, mais uma vez, penetrou a Terra.
Não caiu ruidosamente sobre os cimos, como o raio em seu esplendor. O Senhor forçaria as portas para entrar em sua própria casa?
Sem tremor, sem trovão, a chama iluminou tudo por dentro. Desde o coração de menor átomo até a energia das leis mais universais.
Naturalmente invadiu, individualmente e em seu conjunto, cada elemento, cada força, cada ligação do nosso Cosmo. E este, espontaneamente se inflamou.

Toda a matéria doravante está encarnada, meu Deus, pela vossa Encarnação

sábado, 19 de dezembro de 2009

Padre Toninho: doces e negras lembranças

Conheci Padre Toninho em 1993. Já faz tempo, meu Deus! Eu acabava de voltar de meu doutorado em Roma e fui convidado para participar da ERT, Equipe de Reflexão Teológica da CRB (Conferência dos Religiosos do Brasil). A chegar na equipe, encontrei homens e mulheres que estimularam minha reflexão teológica. Um deles era o Padre Antônio Aparecido da Silva, negro, pertencente ao Instituto dos Orionitas, considerado como “um dos maiores estudiosos e defensores da causa negra na Igreja”.
Convivi com Toninho na ERT durante vários anos. Depois, deixei a equipe ao me tornar provincial dos maristas, pois era impossível conciliar as agendas. No ano de 2001 encontrei Toninho na Assembléia Geral da CRB em São Paulo. Ele também era provincial! Conversamos e demos boas gargalhadas. Eu lhe disse: “quando a gente terminar terminar esta missão, vamos voltar para a ERT, pois somos teólogos. E, em 2005, voltamos a fazer parte da mesma equipe teológica. Foi um festa o nosso reencontro!

Guardo de Toninho, recentemente falecido, doces memórias. Em nossas reuniões, Toninho era o homem do bom humor. Grande companheiro, sabia dizer as coisas com clareza e delicadeza. Seu sorriso era contagiante. Discreto, contribuía sempre com algo original. Podia ser pouco, mas tinha profundidade.
A grande aprendizagem que significou para mim conviver e trabalhar com Toninho foi seu olhar multiétnico e pluricultural, a partir de seu lugar de negro e Afrodescendente. Por isso, digo que guardo de Toninho “negras recordações”.

Toninho foi um homem muito importante para a Vida Religiosa, a Igreja e a negritude no Brasil. Convido você a olhar e entrevista com ele no portal afro.
http://www.portalafro.com.br/entrevistas/padretoni/toninho.htm
Veja também alguns depoimentos sobre ele no site do IHU, da Unisinos
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=28517
Nos últimos anos, acometido por diabetes e perda das funções dos rins, Toninho provou a dureza da doença. Sentia suas forças se esvaindo. No mês de agosto esteve na nossa reunião e se despediu. Sua última intervenção na discussão retratou uma enorme sabedoria.

Certa vez, eu o chamei de “Rei Nagô”, e ele sorriu, se reconhecendo no título. Agora, deve estar festejando com o Ressuscitado, os mártires, os santos e as santas, a festa que no céu nunca termina. Com Atabaque e tambores, a grande celebração do triunfo do Reinado de Deus...
Termino com um texto do próprio Toninho sobre a ressurreição. E me calo, chorando sua perda.“A ressurreição, enquanto acontecimento totalizante e totalizador, instauradora de um novo messianismo e da vigência atual e escatológica do Reino, torna-se ponto de encontro e plenificação de todos os anseios e aspirações. A ressurreição é um fato globalizante, uma sementeira jogada sobre o universo. Deus nos ‘escolheu em Cristo antes de criar o mundo’, nos diz a Carta aos Efésios,’ derramou abundantemente sobre nós’ a sua graça (cf. Ef 1,4.6). Portanto, a ressurreição é o lugar da convergência, assim como a cristologia é a plenificação de todas as antropologias”.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

CNBB e a Conferência do Clima

A CNBB publicou nota convocando os cristãos católicos a fazerem gestos concretos de apoio e mobilização em vista da Conferência do Clima. Veja, divulgue e faça algo em sua comunidade no próximo final de semana.
Nos dias 7 a 18 de dezembro, realiza-se a Conferência da ONU sobre Meio Ambiente - COP 15, em Copenhague. As decisões que serão tomadas pelos governantes terão impacto no futuro da humanidade e em todas as formas de vida no Planeta.
Considerando a importância dessa Conferência, bem como a urgência do tema em pauta, nós bispos do Conselho Episcopal de Pastoral (CONSEP), reunidos em Brasília, nos unimos ao apelo global direcionado aos líderes mundiais, exigindo um acordo corajoso com metas necessárias e mensuráveis na emissão de poluentes. Esperamos igualmente que as populações mais vulneráveis afetadas pelas mudanças climáticas recebam os recursos necessários para a sua adaptação e o seu desenvolvimento sustentável.

Diante da declaração de intenção do Governo brasileiro em diminuir, até 2020, em 38% a emissão de gases que provocam aquecimento da Terra, e a redução de 80% do desmatamento da Amazônia, manifestamos a nossa expectativa para que essas metas sejam acompanhadas por políticas nacionais coerentes, que promovam a sustentabilidade do desenvolvimento humano, especialmente das populações mais empobrecidas e a integridade da criação, em obediência aos seguintes princípios:
· O reconhecimento da água como direito humano, bem público e patrimônio de todos os seres vivos, com a conseqüente implementação de políticas hídricas que priorizem o ser humano e a dessedentação dos animais;
· A implementação de uma ampla política de reforma agrária e agrícola com uma justa distribuição da terra, em favor das unidades familiares e comunitárias, mais produtivas por hectare, geradoras de oportunidade de trabalho, produtoras de alimentos, em consonância com o meio ambiente;
· O aprimoramento e a implementação do Plano Nacional de Mudanças do Clima (PNMC), que orientem de modo adequado e coerente outros planos e iniciativas governamentais;
· A opção por uma matriz energética limpa e diversificada, junto com um maior investimento tecnológico e atenção à sabedoria e ás práticas das populações tradicionais;
· A manutenção do código florestal e a busca de mecanismo de incentivo para a sua implementação;
· Transparência e controle social sobre os investimentos públicos e privados para que as políticas de Reduções de Emissões Associadas ao Desmatamento e à Degradação Florestal (REDD) não sejam regidos pelos interesses do mercado.

Movidos pelos gritos da Terra e dos seus filhos e filhas especialmente, dos mais empobrecidos, conclamamos as nossas comunidades eclesiais a realizarem nos dias 12 e 13 de dezembro próximo, atos que sinalizem nossa preocupação com as decisões que serão tomadas na Conferência de Copenhague. “Antes que seja tarde demais, precisamos fazer escolhas corajosas, que possam restabelecer uma forte aliança entre o ser humano e a Terra” (Papa Bento XVI, discurso em Loreto).
Como gesto concreto, sejam promovidos debates, orações e vigílias junto com iniciativas de outras Igrejas e organizações sociais, Em consonância com a iniciativa das Igrejas de outros Continentes, incentivamos que se dêem 350 repiques de sino, às 12 horas do próximo dia 13 de dezembro. Este gesto simbólico visa alertar os governos a não permitirem que se ultrapassem 350 partes por milhão (PPM), limite máximo e seguro de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, conforme atestam os cientistas que estudam o clima.
Que as celebrações do Advento nos coloquem em vigilante atitude na defesa e promoção da vida na Terra.
Brasília, DF, 10 de dezembro de 2009.
Dom Geraldo Lyrio Rocha (Presidente da CNBB)
Dom Luiz Soares Vieira (Vice-Presidente)
Dom Dimas Lara Barbosa (Secretário-Geral)

sábado, 14 de novembro de 2009

Jornada Teológica Latino-americana

No final de outubro, estive em Santiago do Chile, a convite da coordenação de “Ameríndia”, para contribuir na Jornada Teológica Latino-americana, que aconteceu naquela cidade.
Tive um primeiro contato com “Ameríndia”, grupo de teólogos e pastoralistas empenhados em fortalecer a fé encarnada em nosso continente, durante o Fórum Internacional de Teologia e Libertação, em Belém, no início deste ano. Na ocasião, apresentei o tema “Interfaces da Teologia com a Ecologia”. Alguns membros viram minha apresentação e perceberam que o tema da Ecologia devia ganhar mais destaque nas atividades da Ameríndia. Então, daí nasceu o convite para escrever um capítulo sobre “Ecologia a partir do Documento de Aparecida”, para um livro que apresenta várias faces pastorais a partir do referido documento. Ele já foi publicado na Colômbia, por Paulus, com o nome: “La missión em Questión”. A versão brasileira virá em breve.
A Jornada Teológica no Chile é a primeira de uma série que acontecerá em várias partes do nosso continente. Ela ganhou um sabor especial, devido à comemoração dos 80 anos de Sérgio Silva, teólogo da libertação chileno, que tem uma longa e bela história de reflexão, luta e compromisso com a formação de cidadãos à luz da fé. Sérgio é sobretudo uma figura original. Sempre de bom humor, conta piadas e recorda fatos pitorescos, provocando gargalhadas em seus interlocutores.
Esta Jornada Teológica foi dirigida simultaneamente a distintos públicos. Para os professores de Teologia havia um conjunto de atividades específicas, em forma de conferências e debates, na Universidade Católica, sob o título de: “Sinais dos Tempos e método teológico”. Havia também uma palestra a cada noite, destinada ao grande público, na sede da Conferência dos Religiosos do Chile (CONFERRE). Já agentes de pastoral, padres, religiosos e leigos podiam se inscrever em um seminário temático, com duração de dois dias, no Instituto de Teologia Alfonsiano, dos redentoristas. Ofereceram-se os seguintes seminários: “Leitura comunitária da Bíblia. Orientações de Aparecida”, “Comunidades Eclesiais de Base. Novo impulso a partir de Aparecida”, “Teologia e Povos indígenas à luz de Aparecida” e “Ecologia e Teologia. Uma reflexão a partir de Aparecida”.

A mim coube a tarefa de apresentar três temas no seminário de Ecologia e Teologia: “Ecologia: Panorama e conceitos”, “Teologia e Ecologia: reflexão bíblico-teológica”, e “Aspectos práticos da ecologia a partir do Documento de Aparecida”. Estava comigo Dom Demétrio Valentim, bispo de Jales (SP), que teve uma atuação importante na Assembléia de Aparecida, sobretudo quanto à questão da ecologia e da Amazônia.
Participaram do seminário umas trinta pessoas, que atuavam em diferentes espaços de pastoral e iniciativas socioambientais. Entre eles: grupos de “Paz e Ecologia” de diferentes congregações religiosas, membros de pastorais sociais, religiosas inseridas, participantes de movimentos ecológicos em defesa da Patagônia Chilena e das Águas, e educadores populares.Foi uma experiências enriquecedora para mim. Tive ocasião de partilhar o resultado de meus estudos sobre “Ecologia e Fé”. E senti-me fortalecido, ao ouvir o testemunho de várias pessoas, em outro país, que partilham comigo do mesmo sonho e da mesma causa: um mundo inclusivo, fraterno e sustentável.

domingo, 25 de outubro de 2009

Dom Oscar Romero: lembranças

Em meados de Outubro, estive em El Salvador, para conhecer de perto a vida e a obra de Dom Oscar Romero. Havia assistido antes o filme “Romero”, que utilizei algumas vezes com jovens e educadores em encontros e retiros. Retive da película a coragem crescente deste homem, sua retidão, o amor ao povo empobrecido, e a cena trágica de seu assassinato durante a celebração da eucaristia. Havia lido também trechos de discursos de Dom Romero. E, sobretudo, ouvi a gravação de algumas homilias dominicais dele. Fiquei tocado pela forma como Dom Oscar comentava as leituras bíblicas. Seu discurso era de um seguidor de Jesus, que partia da Palavra de Deus. Ao mesmo tempo, estava tão sintonizado com a situação de seu povo, que não tinha medo de denunciar as injustiças e propor alternativas viáveis para a sociedade, marcada pela violência do regime ditatorial que exterminou, segundo se afirma, mais de 50 mil pessoas.
Oscar Romero nasceu em 1917, no interior de El Salvador. Era o segundo de uma família de sete filhos. Seu pai exercia a função de telegrafista. Em casa, não havia energia elétrica nem água encanada e as crianças dormiam no chão. No início da adolescência, foi para o seminário menor. Completou seu estudos em Roma, na Universidade Gregoriana. Para mim, uma feliz coincidência, pois ali, muitos anos mais tarde, concluí meu doutorado em teologia.
Romero foi ordenado em 1942, em plena segunda guerra mundial. De volta ao seu país, começou a exercer a missão de padre em comunidades do interior. Logo percebeu a importância do rádio na evangelização. Por onde passou fazia programas ao vivo, gravava homilias e estimulava a presença da Igreja neste âmbito. Por um tempo, foi também editor do Jornal Arquidiocesano. Desde cedo foi reconhecido pela sua capacidade de organização pastoral. Em 1970 foi ordenado bispo auxiliar de San Salvador. Em 1974, transfirido para a diocese de Santiago de Maria. Pessoa de grande liderança, Dom Romero era tido como um bispo conservador, que inclusive não sintonizava com as propostas de renovação do Concílio Vaticano II e da Conferência Latino-americana de Medellín. Era sensível para ajudar os pobres, porém em perspectiva assistencialista.
Com o coração aberto e a mente atenta, Dom Romero visitava as comunidades, ouvia as pessoas, tentava compreender a situação pela qual passava seu país. Naquele momento, El Salvador estava sob o domínio de uma ditadura militar, semelhante às outras que assolaram todo o nosso continente. O governo perseguia as lideranças políticas e sociais, torturava e assassinava pessoas e se mantinha impune. Lentamente, Dom Romero foi percebendo que não bastava boa intenção ou gestos individuais. A situação era estrutural e exigia ações coletivas. Para seu processo de conversão aos pobres contribuíram muitas pessoas. Dentre elas, o jesuíta Rutílio Grande, barbaramente assassinado.
Em 1997, Dom Oscar Romero foi nomeado Arcebispo da Capital, San Salvador. Passou a estimular a formação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), rompeu com a aliança da Igreja com as oligarquias locais, organizou comissões para apurar as diversas violações aos direitos humanos no país, promoveu o diálogo e clamou contra a violência. Percebeu que sua postura de enfrentamento em relação ao governo totalitário, que servia às elites aristocráticas do país, poderia lhe custar a vida. E assim aconteceu, no dia 24 de março de 1980.
Visitei inicialmente o túmulo de Dom Romero, que está na cripta da catedral de San Salvador. Infelizmente, devido ao segundo bispo que lhe sucedeu, membro da Opus Dei, seu corpo foi retirado da nave principal e colocado num lugar de menor acesso, pouca visibilidade e horário restrito. Mesmo assim, é visitado constantemente por muita gente, que o reconhece como santo. Vi em outro lugar uma série de testemunhas de “ex votos”, ou seja, de pessoas que deixam registrado que alcançaram graças e curas através de sua intercessão. A atual tumba está revestida com uma cobertura de pedra. Nas quatro pontas há vultos de mulheres e símbolos que evocam cada evangelista. Uma justa homenagem a quem se pautou pelo evangelho de Jesus. Ali me ajoelhei e rezei, pedindo o dom da profecia.
A seguir, fui visitar a casinha onde ele morou. Está localizada dentro da área de um hospital para doentes de câncer, onde atuam as Irmãs Carmelitas. Era uma casa simples e pequena, que foi transformada num museu em sua memória. Lá se pode ver muitas fotos de seus contatos com o povo, as festas e celebrações da qual participou, objetos pessoais, o gravador na qual registrava cada noite seu diário, a cama e a mesa de trabalho. O objeto-símbolo que mais me impactou é a camisa que ele usava no dia de morte, manchada de sangue e com a marca da bala que lhe perfurou o coração (foto ao lado).
Para terminar, a poucos metros dali fica a capela do hospital, local de seu martírio. Dom Romero foi assassinado por um atirador de elitedo exército salvadorenho, treinado nas Escolas das Américas. Sua morte repercutiu em vários lugares de mundo. Hoje, ele é um símbolo da Igreja dos pobres e da espiritualidade da libertação.
Para mim, ver e sentir de perto os locais, as pessoas e os objetos que evocam a memória deste homem de Deus fortaleceu a minha fé. Foi uma ocasião de renovar meu compromisso de colaborar para uma sociedade solidária e sustentável.
São Romero, rogai por nós!

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Blog action Day e os professores


Estive sumido uns tempos, aqui no meu blog.
Volto hoje, num dia especial.
Para começar, celebro o dia dos professores.
Recordo meus mestres, a começar da professora da primeira série, Regina, que me ensinou a ler, escrever e contar. E termino com o grande mestre Libânio, que me introduziu no mundo da teologia. Entrei aí para ficar...
Ah, eu gosto de ser professor, de estimular os alunos a pensar, a refletir, a ampliar seus horizontes, a querer conhecer mais, a fazer do conhecimento um instrumento de transformação.
Parabéns a todos os professores e professoras!
O segundo motivo de festejar hoje é um evento mundial, que reúne blogueiros dos quatro cantos da terra. No dia 15 de outubro de cada ano, a gente se solidariza com um tema importante para o nosso mundo. Neste ano, o Blog action Day está centrado no Aquecimento Global e nas mundanças climáticas.
Ontem vi uma notícia que me deixou indignado. Na primeira página do Estado de Sáo Paulo, se diz: "Por crescimento, Casa Civil veta meta ambiental mais ambiciosa". Segundo o periódico, a proposta que o Brasil quer levar para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Copenhague, em dezembro, esbarrou no "desenvolvimentismo" da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e expôs uma divisão no governo sobre a questão ambiental.
No fundo, nenhuma novidade, pois o atual governo dá mostras que está insensível à questão ambiental. Resta à sociedade civil erguer sua voz. O dia de hoje é uma boa ocasião. Visite os blogs que aderiram ao "Blogactionday".
Da minha parte, como professor, continuarei atuando com meus alunos e outros interlocutores, para que juntos dilatemos a consciência planetária e desenvolvamos atitudes de cuidado com o planeta, nossa casa comum. Nesta tarefa, nossos todos professores e aprendizes... Vamos lá!

domingo, 13 de setembro de 2009

Ecologia e Educação: a hora!

A ecologia, com suas múltiplas faces, é um dos “Sinais dos tempos” que caracteriza o atual momento histórico do planeta. No seu bojo se reflete uma grande mudança na humanidade, que lentamente acontece, em meio a conflitos e retrocessos.

A modernidade científica e filosófica dos últimos séculos provocou um desencantamento em relação à natureza, ao ecossistema. Esta perdeu seu caráter mágico e “sacramental”. A água, os minerais, o ar, os microorganismos, as plantas e os animais foram reduzidos à matéria prima para a produção e a objeto de estudo para a ciência. Foram considerados como coisas, perderam sua relação conosco. O ser humano, na sua versão ocidental, masculina e branca, se transformou no “centro do universo”, no critério decisivo de organizar a existência e o pensar. É o que chamamos de antropocentrismo moderno.

No entanto, fatos e reflexões dos últimos vinte anos, mostraram a insuficiência da razão científica, a insustentabilidade do atual modelo de produção econômica e a mediocridade da cultura globalizada, que ignora a diversidade. Os sintomas de uma crise planetária, tocando ao mesmo tempo os indivíduos, as nações e o ambiente, são visíveis: falta de sentido para a existência, perda da qualidade de vida, eclosão de novas formas de pobreza e exclusão social, aumento da violência e da insegurança social, mudanças climáticas ocasionadas pela soma de vários fatores. Ou seja, o antropocentrismo moderno, tão orgulhoso e auto-suficiente, mostra-se decadente, um gigante com pés de barro. Presenciamos então um desencanto em relação à vida.

Felizmente, há também um movimento múltiplo, de natureza ética, cultural, social e espiritual, que cresce em todo o planeta, com sinais esperançosos. Não se trata de um movimento único, orquestrado, mas de manifestações plurais, algumas convergentes e outras em conflito, mas que lentamente vão se articulando e buscando sentido comum. Destacamos, entre elas, a afirmação crescente do papel da mulher e a questão de gênero, o resgate das culturas e etnias não ocidentais (afro-descentes, indígenas, orientais asiáticos), o empenho por uma cultura da paz, da tolerância e da diversidade, as tentativas de estabelecer relações econômicas justas no mundo, e sobretudo, uma nova consciência ecológica. Tudo isso impacta na educação.

O caos no qual estamos imersos está nos abrindo possibilidades inusitadas, como pessoas, cristãos e educadores. A crise civilizatória atual faz lembrar a experiência do apóstolo Paulo. Ele tinha tantas certezas! Mas, um dia, “caiu do cavalo” e ouviu uma interrogação do Mestre. Necessitou passar uns dias na completa escuridão, numa cegueira externa que lhe possibilitou repensar a vida. Depois das trevas veio uma luz que lhe iluminou toda a existência. A questão ecológica oportuniza um novo olhar sobre os indivíduos, a espécie humana e todos os sistemas vivos. Nós, seres humanos, nos redescobrimos como parte da natureza e interdependentes em relação a todos os outros seres. Coloca-se novamente no centro das nossas existências a ética, os valores que nos movem, e como estes valores se traduzem em atitudes pessoais e ações coletivas. Percebe-se que a emoção tem uma importância vital nos processos humanos, desde a aprendizagem escolar até a gestão de processos, numa pedagogia empreendedora. E a mística, como desejo de se religar a algum sentido maior, para além da razão e do subjetivismo, volta à ordem do dia. Então acontece um reencantamento em relação à existência humana, à natureza e ao Divino. Estes processos são simultâneos e transversais. Avançamos sim, em meio ao desencantamento da mentalidade moderna que tudo pretende explicar e dominar, ao desencanto de uma crise civilizatória e ao reencantamento do brilho do novo olhar sobre nós e o mundo.

Nós educadores, somos pessoas que vivemos tudo isso, a começar de nossa existência pessoal, íntima, familiar. Talvez não tenhamos consciência plena da beleza e do desafio do momento que partilhamos com outros seres humanos. E que a nossa contribuição é muito importante, pois irá somar com a de tantos outros, nos mais diversos setores da sociedade, em todos os recantos da Terra. Paulatinamente, vamos compreendendo que a questão ecológica não é uma coisa pequena (embora se manifeste a partir de simples atitudes) e nem ocasional. Ela toca a compreensão de mundo, a forma de vive e atuar, subjetivamente e comunitariamente. Por isso, deve provocar mudanças nos processos pedagógicos e pastorais na escola.

A ecologia impacta na escola em várias vertentes:
- epistemológica (carácter e finalidade do conhecimento),
- metodológica (como conhecer),
- ética (valores e relações interpessoais)
- e espiritual (mística como re-ligação com Deus e suas criaturas).
A luz da consciência ecológica provoca uma mudança no núcleo da atividade básica da escola, que é a (re)elaboração do conhecimento. Percebe-se com clareza que a escola necessita extrapolar a sala de aula e os manuais didáticos. Os educadores e os alunos, à medida que conhecem melhor seu entorno, trazem novas perguntas (a respostas também) para ampliar a espiral do conhecimento. Compreender os ciclos da natureza - e do ser humano nela inserido - exige experimentação, implica o exercício dos sentidos, o envolvimento do corpo e das emoções. Significa superar a frieza da experiência científica moderna, na qual o pesquisador é o sujeito e a natureza, em duplo sentido, o “objeto”. Conhecer é também experimentar-se, estabelecer relações com outros seres, admirar sua beleza e acolher seus limites. O conhecimento também abre as portas à contemplação, a perceber o sopro do Espírito de Deus nas criaturas. Basta que o olhar se mantenha encantado.

Aceitar o paradigma ecológico (ou a dimensão ecológica da existência) leva a rever os métodos pedagógicos e a estreitar os laços entre as diversas áreas do saber. Pois a visão holística privilegia a compreensão das relações, e não somente o conhecimento focal e isolado. Faz ver como as diversas dimensões do real se implicam mutuamente. Ajuda a retomar a unidade original, que se perdeu à medida que foi necessário segmentar os saberes, para progredir no desenvolvimento da ciência. Uma concepção ecológica valoriza o protagonismo do aluno e põe novamente a questão da importância das vivências cotidianas para a sistematização do conhecimento. Tal perspectiva vem ao encontro do esforço que se realiza, em tantos lugares e há muitos anos, de uma educação significativa para os alunos e com os alunos, desde a proposta da educação evangélico-libertadora, até as contribuições do construtivismo sócio-interacionista.

Se podemos falar de uma “eco-pedagogia”, ela implica assumir a dimensão ética do saber. O que fazemos com o que conhecemos? Infelizmente, o conhecimento moderno se tornou, em primeiro lugar, fonte de acumulação de riqueza individual e manifestação da vaidade. Quem conhece somente para si se assemelha a alguns personagens do filme de desenhos “Kihiro”: bestializa-se com um porco glutão ou se torna um espírito destruidor que pretende seduzir a todos. A ética ecológica tem uma intenção ampla. Propõe um sentir co-responsável que ultrapassa todas as fronteiras, a ponto de nos percebermos “cidadãos planetários”. E, ao mesmo tempo, valoriza as atitudes individuais e as ações comunitárias locais, pois somente estas alavancam mudanças reais que alimentam nossa esperança. A escola, como espaço inter-geracional de relações cotidianas, pode ser um espaço privilegiado para gerar atitudes de cuidado consigo mesmo, com os outros e com o ambiente.

Uma parte significativa dos alunos das escolas católicas particulares são membros de famílias abastadas, com um padrão de consumo bem maior do que a média da população. Isso significa também: produzir muito lixo e deteriorar o ambiente. É necessário ajudar os alunos e suas famílias a serem consumidores conscientes, a usar racionalmente a água e de energia, a perceber a “pegada ecológica” que eles deixam para trás, a perceber a necessidade de uma produção ecologicamente sustentável. Para isso, a escola necessita de uma política ambiental clara, que envolva a todos, desde o funcionário dos serviços gerais até o diretor, e se traduza em gestos pessoais e institucionais ambientalmente educativos.

Conforme L. Boff, o ser humano é exterioridade (materialidade, presença), interioridade (desejo, emoção, imagens) e profundidade (pergunta-se de onde vem e para onde vai, pelo sentido). A espiritualidade consiste em cultivar “o espaço de profundidade, em enriquecer o centro de nós mesmos, em alimentar a dimensão do espírito com a amorosidade, a solidariedade, a compaixão, o perdão e o cuidado para com todas as coisas”. Por tais valores e atitudes se revela o espírito e se tece a espiritualidade. O ser humano tem inteligência intelectual, emocional e espiritual. A integração das três nos abre à comunhão amorosa com todas as coisas, numa atmosfera de respeito e de reverência para com todos os seres. Se o espírito é vida e relação, seu oposto não é a matéria, mas morte, ausência de relação. Espiritualidade, neste contexto, “é a potencialização máxima da vida, é compromisso com a proteção e expansão da vida (..) em toda a sua incomensurável diversidade e em todas as suas fases de realização”. Uma espiritualidade ecológica é profundamente integradora, e ajuda a superar a dicotomia entre sagrado e profano, espírito e matéria, que perseguiu o cristianismo durante muitos séculos. Vale recordar aqui a experiência e a reflexão de Teillard Chardin, um padre e cientista do século passado, que expressou de muitas formas esta unidade interior. Ele dizia: “Toda a matéria doravante está encarnada, meu Deus, pela vossa Encarnação”.

Creio que a escola pode ser um espaço maravilhoso para experimentar e celebrar o Deus da vida, cujo Espírito criador e redentor (recriador) passeia pela vastidão do universo e pela biodiversidade de suas criaturas. Está na hora de dar um passo maior. Para essa fascinante tarefa, somos todos convocados, como artífices e aprendizes.
(Versão modificada de texto apresentado no último Congresso Nacional da AEC)