sábado, 13 de dezembro de 2008

Sim, é possível

Desde que a crise econômica tomou conta dos mercados mundiais, os governos se mobilizam para conter ao máximo possível a temida recessão. Algumas medidas, no entanto, chamam a atenção de qualquer cidadão conectado com o mundo. Algo está errado, pois o remédio proposto está contaminado pela mesma causa da doença. Os governos, inclusive o do Brasil, continuam alimentando o capital financeiro, que é o pivô da crise. Liberam enorme quantidade de recursos para os bancos e intervêm nas bolsas. Ora, “os senhores do mundo” esqueceram-se rapidamente de um dogma fundamental do neoliberalismo: a “mão invisível do mercado” iria controlar suas distorções. Hoje temos clareza que a tal mão pode ser invisível, mas é muito ativa: surrupia, explora e concentra.
Nas medidas anunciadas recentemente pelo governo brasileiro, visando aumentar o consumo, não se tocou na taxa de juros, um mecanismo perverso que favorece o capital financeiro, à custa do capital produtivo e do bem de toda a população. Como no Brasil os pobres só podem comprar à prestação, acabam pagando mais. E muito mais... Clóvis Rossi, em artigo da Folha de São Paulo de 12 de dezembro, diz: “Lula terceirizou a política econômica para Meirelles, que faz o que bem entende com os juros. Foi a maneira que encontrou para acalmar as piranhas do mercado financeiro, as únicas que podem desestabilizar um governo que não lhes dê o sangue que pedem insaciavelmente”. Então, vejam só, o mercado financeiro não tem somente mãos enormes para capturar, mas também dentes afiados e vorazes.
Nesta mesma semana aconteceu um encontro internacional sobre mudanças climáticas, na Polônia. É evidente que a humanidade, como um todo, necessita reduzir a emissão de gases de efeito estufa. Se não fizer isso logo, haverá perda de biodiversidade, diminuição da qualidade de vida, redução da área cultivável para agricultura, aumento dos fenômenos extremos de tempestades e secas etc. Ou será que já esquecemos, em tão curto de espaço de tempo, o que aconteceu recentemente em Santa Catarina? Mas, os interesses imediatos do poder econômico freiam as iniciativas e levam a reduzir as metas.
Entre as medidas adotadas pelos governos, visando a vitalidade da economia, está o socorro às indústrias automobilísticas e o estímulo à compra de carros novos. Ora, a emissão de gases dos veículos automotivos é um dos fatores responsáveis pelo aquecimento global. Além disso, com o aumento da frota em circulação, gera-se um caos no trânsito das grandes cidades, que impacta na saúde da população e diminui a produtividade da economia. Então, é uma ação que favorece a destruição do meio ambiente, não visa a inclusão social, e em longo prazo tem um custo econômico.
Os recentes estudos de Valoração Ambiental e de Economia Ambiental mostram que é falso o dilema: desenvolvimento x ecologia. Os governos poderiam estimular a economia de outras formas, favorecendo ao mesmo tempo a equidade social e a sustentabilidade ecológica. Por exemplo, há no Brasil um enorme déficit de habitação, e moradia é direito básico do ser humano. Incentivar a construção civil, não somente através das grandes construtoras, mas também promovendo empreendedores coletivos, aqueceria o mercado de trabalho e responderia de forma clara a uma necessidade do país, especialmente dos mais pobres. Além disso, se estimulasse a formação de cadeias produtivas ecologicamente sustentáveis, geraria oportunidades de trabalho e contribuiria para manter aquecida a economia.
As soluções existem. Um mundo diferente deste que está aí, submetido a mãos invisíveis e dentes vorazes, é cada vez mais possível e necessário, como proclama o Fórum Social Mundial. Sim, é possível! Com outras mãos e outros corações.

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