Hoje recebi uma notícia triste. Faleceu em Uberlândia (MG), nesta madrugada, Frei Prudente Nery. Perdi um amigo, um grande teólogo e meu orientador espiritual dos últimos anos. E o mundo perdeu um homem iluminado.Lembro-me de seu bom humor, de suas observações originais e profundas. Com a voz suave, quase sussurrando, falava com o vigor e a liberdade dos profetas bíblicos. Como filho de São Francisco, amava a simplicidade, a vida escondida, a discreção, o ambiente familiar.
Ao mesmo tempo, transitava com facilidade por distintos saberes: a teologia, a filosofia, a psicologia, a antropologia. E nisto residia o prazer daqueles que o ouviam. Prudente jamais se repetia ou caia em “lugar comum”. A ele cabia uma originalidade sem par. A palavra que iluminava, desvelando a presença de Deus no cotidiano, nas buscas humanas. Uma admirável síntese do rigor alemão com a fluida poesia.
Faz algum tempo, Prudente deixou uma meditação sobre a morte. Esta mesma “irmã morte” que pai Francisco recordou ao final do Cântico das Criaturas. Dela seleciono o último parágrafo. Certamente, agora, Prudente experimenta o que poeticamente anteveu.
"Quando chega o inverno no hemisfério norte, sem que ninguém os instrua, os pássaros erguem-se espontaneamente aos céus em incrível aventura. Conduzidos por um misterioso legado de sua espécie, seguindo apenas os pulsos magnéticos da terra, eles voam, pelas trilhas do sol, milhares de quilômetros, noite e dia, à busca apenas de permanecer na vida. Assim há de ser também conosco, quando, no crepúsculo de todos os outonos, cair sobre nós o frio do inverno. Carregados, então, pelo fascinante destino de nossa espécie, nós voaremos, seguindo apenas os acenos da eternidade, rumo à morada da luz, o coração de Deus. E aí saberemos o que, agora, apenas intuímos e, ouvindo Jesus Cristo, o Caminho, a Verdade, a Vida, cremos: Não existem dois reinos, o reino dos mortos e o reino dos vivos, o reino da terra e o reino dos céus, mas apenas o Reino de Deus, que quis que fôssemos eternos".
